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NA ROTA DOS CAÇAS

21.03.2011

 

O prefeito de São Bernardo, Luiz Marinho, mostra como o poder executivo municipal

Ex-funcionário da Volkswagen, Luiz Marinho é um dos políticos brasileiros formados no movimento sindical que integrou o alto escalão do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Enquanto presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), foi convocado pelo ex-presidente para ser ministro do Trabalho. Amigo pessoal de Lula, o metalúrgico recebeu também a incumbência do Ministério da Previdência. Em 2008, Marinho foi eleito prefeito de São Bernardo, berço político do ex-presidente e sede principal da indústria automobilística instalada no Brasil. A cidade detém o 12º maior Produto Interno Bruto (PIB) do País. Com o objetivo de atrair investimentos para o município, o ex-sindicalista colocou um holofote nos debates sobre inovação, transferência de tecnologia e cooperação produtiva entre o Brasil e as empresas que disputam a licitação dos 36 caças supersônicos da Força Aérea Brasileira. A partir dos debates sobre a operação, ressuscitados pelas visitas do prefeito de São Bernardo às fábricas da Saab e da Dassault, dois dos três concorrentes, a presidente Dilma Rousseff, que herdou a possibilidade de decidir, preferiu conhecer a fundo as propostas. Além das tratativas em torno dos projetos de instalação do polo de tecnologia aeroespacial em São Bernardo, Marinho também fala para INOVABCD sobre políticas públicas de inovação, reajuste de salário mínimo e cortes de investimentos públicos. E, de passagem, também revela o que Lula, Dilma e Nelson Jobim pensam do negócio dos caças.

Vinicius Morende

vinicius@abcdmaior.com.br

INOVABCD – Qual a importância da inovação para o desenvolvimento econômico brasileiro?

Luiz Marinho

– Para mim, pensar em inovação é pensar como no futuro poderemos ter soluções mais eficientes, mais baratas e mais sustentáveis do ponto de vista ambiental. Acho que são, principalmente, as universidades que têm o papel de pensar e pesquisar a evolução do conhecimento e da tecnologia. Mas, todos podem produzir inovação. E não adianta esperar que as universidades privadas se responsabilizem pela produção de inovação. A universidade pública é que tem o papel de formar gente para o mercado de trabalho, para produzir o diferencial tecnológico.

INOVABCD – O Brasil dá importância para isso, ou pelo menos provê o avanço disso?

Marinho

talvez os avanços não tenham sido suficientes para dar conta da nossa demanda. Nós evoluímos muito na quantidade de pesquisas e teses publicadas, marcas licenciadas, mas estamos distante do potencial do povo brasileiro. Temos que dar sequência aos investimentos e buscar aumentar os recursos disponíveis. Aliado a isso, é necessário investimento no ensino técnico, para responder às necessidades geradas pelo crescimento da economia brasileira. O poder público está fazendo sua parte. Já as

empresas têm que investir mais em pesquisa e tecnologia. As universidades privadas também devem fazer o mesmo. Compare os investimentos em pesquisa de empresas no exterior e o investimento das empresas brasileiras. Não é só pedir para o setor público fazer, o privado também tem que se comprometer. Afinal, toda a inovação, toda a descoberta, beneficia a todos.

– Estamos avançando bastante. Se olharmos o que tinha de recursos para a pesquisa no Ministério de Ciências e Tecnologia em 2003 e agora, há uma grande evolução de investimentos. Dado o tamanho do crescimento da economia brasileira,

INOVABCD – Em que pé está o projeto Cidade Digital, que oferece banda larga para a cidade inteira?

Marinho

– Nós estamos fazendo investimento público para montar a infovia. Até abril, a gente complementa os arcos de fibra ótica para que todos os órgãos municipais sejam ligados em rede, criando a condição de monitorar a segurança, o transporte, o clima e os seus efeitos para a cidade. Isso tudo para melhorar a qualidade de vida e alertar a população de possíveis proble-mas. O importante é pensar o conceito da Cidade Digital, investir na educação com a distribuição de 15 mil netbooks para a rede municipal para que as crianças, (hoje) com sete e dez anos, quando tiverem 20 anos possam ser talentos formados. A inovação e a pesquisa dependem de talentos. Precisamos estimular para fazer estes talentos aparecerem mais cedo.

INOVABCD – Como presidente da CUT, em 2004, você idealizou a política de valorização do salário mínimo, com reajuste da tabela do imposto de renda, como forma de transferir renda e fortalecer o mercado interno. Você acha que já era hora de interromper o processo de reajuste do salário mínimo com aumento real?

Marinho

a política valeria até 2023, para que o salário mínimo atingisse um patamar robusto. Como se dizia que não dava para aumentar o salário mínimo, pois isso geraria inflação, condicionamos o aumento à variação do PIB consolidado dos dois anos anteriores

ao período do reajuste. Isso, para justificar que a política era sustentável e não geraria inflação. Diziam que isso era pouco. Tanto não era pouco que veja o crescimento do salário mínimo nos últimos anos. O elemento principal do sucesso do Brasil e do crescimento do mercado interno não é o Bolsa Família. É a política de valorização do salário mínimo. Este ano teve a reposição da inflação, mas no ano que vem tem um grande crescimento com aumento real do salário mínimo previsto. É óbvio que cabe o debate a partir da regra, mas o corte orçamentário de R$ 50 bilhões não dá espaço para antecipar um pedaço da variação do ano que vem. O mais importante é a garantia da manutenção do acordo de crescimento ancorado na variação do PIB, política que se mostrou correta. Este ano o reajuste pegou o vale, no ano que vem pega o pico. Quem vaiou o (deputado federal) Vicentinho neste ano, no ano que vem vai aplaudir.

– Não houve interrupção. Como ministro, eu negociei com as centrais sindicais esta política determinada por algumas regras que foram negociadas a partir da formação de grupos de trabalho e avaliação de estudos. A partir daí estabelecemos que

INOVABCD – A falta de aumento real para o salário mínimo neste ano deve afetar a economia do País?

Marinho

– Nós temos que ter a preocupação com o investimento e o crescimento, mas também devemos ficar atentos à inflação. Nós sabemos o quanto a inflação corrói o poder de compra do trabalhador. Nós tivemos uma época em que reivindicávamos o pagamento semanal, para que a inflaçãonão "comesse" o salário do trabalhador. O trabalhador é a maior vítima de um processo inflacionário, pois não tem como se defender. Se ele tiver um salário muito justo, ele não suporta, e esta é a realidade da classe trabalhadora brasileira. O salário mínimo ainda é o grande objetivo de quem está desempregado.

INOVABCD – O corte de R$ 50 bilhões no orçamento pode influenciar o desenvolvimento da economia brasileira neste ano?

Marinho

para que a economia continue crescendo.

– Eu vejo o corte como uma freada necessária, especialmente pelo controle da inflação. É necessário fazer o ajuste de passagem de um governo para o outro com a garantia da sustentabilidade e da continuidade do crescimento. O corte é necessário

INOVABCD – O corte no orçamento também pode influenciar no processo de compra dos caças supersônicos para a renovação da frota da FAB? A presidente Dilma já anunciou que a decisão deve acontecer neste ano, mas a compra deve

ocorrer em 2012.

Marinho

– Eu acho isso uma bobagem. Não tem desembolso do Brasil em curto prazo. Pode até ser usado como desculpa, mas não deveria. A data da decisão pode ser influenciada pela necessidade da presidente Dilma conhecer os três produtos, estar segura da melhor decisão política e econômica a ser tomada. Pelas informações que tenho, eu não vejo razão para postergar a decisão por conta disso. A minha visão é que a definição entre os caças e a compra deve ser feita entre o final deste ano e o começo de 2012. Eu acho que o governo brasileiro tinha que decidir isso logo e exigir que as unidades sejam feitas no Brasil, pois o País tem condições de produzir as aeronaves.

INOVABCD – A prefeitura conta com o apoio, ou está dialogando, com outras esferas do poder público a fim de influenciar de alguma forma a decisão da presidente Dilma sobre a compra dos caças?

Marinho

projeto possibilitar à Embraer aumentar seu índice de nacionalização. O Vale do Paraíba pode se fortalecer ainda mais enquanto surge um novo polo em São Bernardo atuando em cooperação com o Vale.

– Não. O maior objetivo é garantir investimentos do vencedor em São Bernardo e na Região. Isso já teve efeito, com os investimentos da Saab no Centro de P&D que está sendo instalado no município. Nós estamos em busca dos três concorrentes, para que, independente da decisão, a cidade receba investimentos. Concretamente, a minha ida para a Suécia, minha abordagem alertando os suecos sobre como deveriam atuar para que tivessem chances de disputar a licitação, o meu contato com os franceses, chamando a atenção de que eles estão atrasados no relacionamento e no comprometimento com a indústria brasileira, têm como objetivo estimular os investimentos em São Bernardo e o desenvolvimento da indústria de defesa nacional. Isso respeitando os polos industriais já formados, como é o caso do Vale do Paraíba (SP) e Gavião Peixoto (SP). Tem gente que se preocupa porque eu estou querendo "roubar" empresas para o ABCD. Não existe nada disso. Não tem como estes lugares perderem investimentos por conta desta mobilização. Quem vai liderar este projeto é a Embraer. O que temos é que desenvolver novas empresas e através deste

INOVABCD – O fortalecimento da indústria de Defesa nacional trará inovação para o parque industrial brasileiro?

Marinho

tecnologias na Região, lidando com produtos e serviços de alto valor agregado. É uma grande oportunidade.

– A indústria de Defesa é uma indústria de alta tecnologia, de muito conhecimento. Qualquer uma das aeronaves que disputam a licitação tem muita tecnologia e inovação e agrega muito para o trabalho de pesquisa que nossas universidades devem fazer. Os institutos de pesquisas do ABCD têm que se envolver totalmente em projetos como este. A indústria de defesa é a grande possibilidade de avançarmos na questão da inovação, do conhecimento e do desenvolvimento de

INOVABCD – Você recebeu a visita do ex-presidente Lula há algumas semanas. O que ele acha da sua participação nesta disputa? Ele ainda defende o projeto francês?

MARINHO

– Na visão do presidente Lula, isso não é a compra de um simples equipamento ou pacote de tecnologia, é um relacionamento de Estado. A França seria um Estado parceiro, para pensar não só a defesa, mas a inserção global do Brasil. Seria uma parceria estratégica de longo prazo. Os Estados Unidos são um bom parceiro comercial, mas têm dificuldades para se tornarem parceiros estratégicos. A Suécia é uma nação menor, mas do ponto de vista tecnológico tem muito a oferecer. Do ponto de vista de São Bernardo, o que importa são investimentos. Então tenho que me relacionar com os três. Mas, eu preciso respeitar esta visão macro que só a presidente (Dilma Rousseff) pode dar. Minha influência na decisão dela é quase zero, eu não tenho esta pretensão. Nosso objetivo é estabelecer relações com estas empresas e países para apresentar o potencial da nossa cidade e da Região. Por exemplo, vamos imaginar que a Boeing não seja a vencedora. Mas, a empresa não faz só caças. Ela pode vir a ter interesse de investir na Região a partir da apresentação adequada da cidade e do ABCD. O mesmo vale para a Saab e para a Dassault.

INOVABCD – E o ministro da Defesa Nelson Jobim, você acha que ele mudou de postura quanto à licitação FX-2 após a chegada da presidente Dilma e o interesse dela pela proposta da Boeing?

Marinho

– O ministro Nelson Jobim tem uma visão clara deste processo, favorável ao Rafale, e isso não muda. A Dilma é que ainda não indicou quem ela acha melhor. Há uma sinalização da presidente de estudar o processo e avaliar política e economicamente as vantagens dos três para tomar a decisão.

pode atrair recursos privados e fomentar o desenvolvimento Regional

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